Onde eles se conectam?
Há pouco mais de 20 anos, o conceito de “Economia Criativa” tem sido discutido internacionalmente como gerador de desenvolvimento econômico, funcionando como motor das economias desenvolvidas e em desenvolvimento, por serem capazes de deslocar empregos altamente baseados em técnicas operacionais e em tarefas repetitivas fisicamente exigentes, com trabalhos que exigem habilidades bastantes intelectuais para análise e julgamento. A economia criativa envolve a formação de uma ideia sobre as características substantivas e o significado da economia criativa, bem como o domínio de vários métodos científicos para resolver os problemas da formação de oportunidades criativas no campo da geração de novas ideias e sua implementação. (Texto original em: medium.com)
Tal conceito, até chegar ao termo atual de “Economia Criativa”, tem se desenvolvido nos últimos tempos e reflete as mudanças ocorridas na economia global, onde economias outrora centrada na produção de bens passam a dar lugar à expansão impulsionada por setores específicos de serviços. John Howkins (2001), afirma em seu livro “The creative economy – How people make money from ideias”, que essas atividades criativas abrangem aquelas empresas movidas pela produção de propriedade intelectual, que surgem principalmente da criatividade, como forças motrizes para geração de riqueza e empregos, causando impacto nas indústrias relacionadas como influenciadores políticos, sociais e educacionais de sua comunidade. Alguns anos depois, o autor cita que na economia criativa o principal valor capitalizado são as novas ideias, ou seja, “pensar é já um ato de trabalho”. Portanto, trata-se da economia baseada na inovação, novidades e produtos criativos (Howkins, 2006). Entretanto, um produto inovador não precisa ser uma nova tecnologia, podendo ser algo familiar posicionado sob um novo ângulo, em um novo contexto, ou seja, algo que possa surpreender os futuros consumidores.
Portanto, é correto afirmar que a atenção de um número significativo de organizações, pesquisadores e especialistas hoje se concentra na criação de soluções e empreendimentos inovadores. Não é por acaso que pesquisadores e especialistas já percebem a inovação como a base do desenvolvimento do empreendedorismo. O objeto da análise são os métodos e ferramentas de criação e desenvolvimento de processos de negócios que formam a base da atividade de uma empresa inovadora e o empreendedorismo (Vakhovych, 2014). Ainda, dizer que a inovação é importante para uma organização parece óbvio. Porém, nos últimos anos, o próprio conceito de inovação evoluiu tanto que parece não ter fim para sua evolução. Portanto, saber como e por que inovar tem sido uma das questões mais analisadas por acadêmicos e profissionais da indústria. Antti Hautamäki (2014) afirma que a economia global entrou em uma fase liderada pela inovação e a capacidade de inovar de maneira cíclica e constante tornou-se um pré-requisito para a competitividade de empresas, que operam em uma esfera totalmente internacional, onde o mercado e os recursos já não são mais locais, e sim globais.
Um pouco de história sobre a “inovação”:
Existem registros bastantes antigos da definição de inovação na literatura de economia e negócios. Talvez um dos principais autores seja Joseph Schumpeter e sua teoria que visava explicar as atividades que levam aos ciclos de expansão e contração do sistema capitalista. Desde Schumpeter, o conceito de inovação se concentra predominantemente em desenvolvimentos econômicos e técnicos, enquanto as ciências sociais estavam particularmente interessadas nos processos e efeitos sociais correspondentes (Harrison, 2012). Schumpeter descreveu um processo em que as inovações mais recentes eventualmente substituíram as inovações mais antigas, no que ele chamou de “destruição criativa” (Schumpeter, 1939). Historicamente, a visão de ondas longas foi levantada inicialmente por Kondratieff, mas foi muito bem aplicada por Schumpeter (Harrison, 2012) para desenvolver uma teoria relevante do que ele chamou de “conglomerado de inovações”. Tais ondas estão se aproximando a cada dia, ou seja, o intervalo entre cada uma delas está ficando menor. Isso é um indicativo de alguns fenômenos que estão ocorrendo devido ao desenvolvimento de tecnologias que apresentam crescimento exponencial.
Fonte: adaptado de História das ondas de inovação (The Natural Edge Project, 2012)
Então, por que a inovação é tão importante para uma organização que teóricos e práticos a conhecem há tanto tempo? Segundo o Manual de Oslo (OCDE, 2006), inovação é a introdução de algo novo em qualquer atividade humana. A diversidade de significados da inovação se dá pela abrangência de sua aplicação como vetor de desenvolvimento humano e melhoria da qualidade de vida. Pode-se dizer que a inovação é um dos conceitos mais difíceis de definir no mundo dos negócios. Podemos dizer que isso se deve à constante expansão e aprendizado de todos as partes envolvidas. Ainda, por se tratar de algo relacionado a troca de conhecimento entre diferentes partes, entender as partes e como interagem umas com as outras se faz muito necessário.
Ambientes de inovação e a geração de valor econômico:
Estudos recentes sobre inovação levam com frequência ao fato de inovações florescerem em ambientes interativos especiais. Tais ambiente passaram a ser denominados “Ecossistemas de Inovação”. A metáfora do ecossistema enfatiza a interação benéfica entre diversos fatores e atores, bem como interdependência entre eles, sendo capaz de gerar autorregularão. Portanto, um ecossistema não precisa de orientação externa para ser viável. De maneira análoga, em ecossistemas naturais, certas espécies florescem porque possuem ótimas condições de vida e as cadeias alimentares em que estão incluídas são completas (Hautamäki, 2014). De acordo com Granstranda e Holgerssonb (2020), o conceito de ecossistemas de inovação tornou-se popular nos últimos 15 anos, levando a um debate sobre sua relevância e rigor conceitual. Ainda de acordo com Hautamäki (2014), ecossistemas de inovação podem ser examinados tanto em termos de geração de ideias quanto de execução de ideias.
Hautamäki cita o ecossistema do Vale do Silício, que é caracterizado por uma cultura empresarial muito forte que abrange criatividade, tomada de riscos, orientação para o trabalho e intercâmbio cooperativo, sendo bastante propício ao surgimento ou aumento de atividades empreendedoras, assim como mais tolerante ao risco e com estruturas que apoiam a cooperação entre negócios. Isso torna o ecossistema de inovação em si em um enorme laboratório para testar novas ideias.
Ecossistema do Vale do Silício – Fonte: (Hautamäki, 2014)
Tal configuração de ecossistema tem sido propositalmente estimulada a existir em diferentes locais ao redor do mundo. Entretanto, todos precisam ser da mesma maneira? Certamente, não. Entretanto, sem entrar na discussão sobre o melhor modelo existente, é importante trazer à tona o conceito de externalidade econômica para demonstrar o relacionamento da inovação, como vantagem competitiva e geradora de valor, com a economia criativa.
Externalidade necessária para a existência da inovação:
De maneira bastante resumida pode-se dizer que uma externalidade é um custo ou benefício causado por um produtor que não é incorrido financeiramente ou recebido por esse produtor. Uma externalidade pode ser positiva ou negativa e pode resultar da produção ou do consumo de um bem ou serviço. Os custos e benefícios podem ser privados – para um indivíduo ou uma organização – ou sociais, o que significa que podem afetar a sociedade como um todo. Basicamente, é importante observar que o fenômeno da externalidade ocorre em uma economia quando a produção ou consumo de um bem ou serviço específico impacta um terceiro que não está diretamente relacionado à produção ou consumo desse bem ou serviço. Podemos citar um evento artístico acontecendo em um ambiente da cidade e afirmar que terceiras partes como produtores locais, empresas de viagem e turismo, entre outros, que não estão fazendo investimento direto no evento, se beneficiarão com ele.
Fluxo de valor entre atores do caso 1 – Fonte: Própria Autoria
Portanto, pode-se dizer que, a externalidade deve ser sempre observada, entretanto, tudo muda dependendo do olhar do observador. Por exemplo, se o observador for um investidor ou um grupo de investidores, ele tenderá a ignorar tudo que não pode ser recuperado como investimento, ou seja, a sua conta vai estar relacionada a quantidade de atores e stakeholders que ele é capaz de incluir em sua cadeia de valor, especialmente via contratos formais. O valor investido deve ser inferior ao valor recuperado por meio de retorno financeiro oriundo de produtos e serviços vendidos junto aos participantes. Parece simples, mas não é!!
Entretanto, imagina que você investidor não faz parte de uma empresa ou mesmo não representa um grupo de investidores, mas sim uma cidade, país ou região? Pois é, o olhar desse investidor é ou deveria ser muito mais simpático ao conceito de externalidade, uma vez que o valor investido em serviços baseados na criatividade e que conectam muitos atores, possuem uma grande capacidade de multiplicação e geração de valor para partes que ele mal consegue vislumbrar. Por isso, o seu comportamento não pode ser apenas orientado a buscar o retorno direto no valor investido com aqueles que possuem relações formalizadas, mas sim entender o máximo possível daquilo que não é facilmente observável. Ainda, buscar criar os elementos geradores de valor para cada serviço gerado por meio da criatividade.
Fluxo de valor entre atores do caso 2 – Fonte: Própria Autoria
Portanto, utilizando a ideia de externalidade é possível entender o porquê da geração de contratos de alto risco entre investidores e startups, uma vez que o olhar do investidor (no caso 1) é muito orientada a sua análise de retorno sobre investimento (ROI) da iniciativa e, essa análise busca ver valor somente na parte observada de maneira direta. Entretanto, pensando como um investidor estado ou governo, torna-se importante observar que, mesmo sem sabermos exatamente todo o potencial de valor gerado do empreendimento, as chances de sucesso dependem da capacidade de muitos outros atores em gerar valor em cima do conhecimento, tanto para conseguir destaque na venda de seus produtos e serviços (gestão, marketing entre outros), bem como na geração de novos serviços baseados na cultura e criatividade. Conforme mostrado anteriormente, a qualidade da força de trabalho, que depende da colaboração e interconexão entre Instituições de ensino e indústria, comportamentos voltados ao empreendedorismo, colaboração entre partes e, principalmente, abertura e conforto para investimentos são muito importantes para o sucesso de um ecossistema. Para o último caso, é possível observar a relação dialética entre a abertura para investimento e os casos de sucesso já existentes, que são diretamente dependente dos fatores mencionados.
Resumindo, podemos dizer que a relação da economia criativa com ecossistemas de inovação é direta, entretanto, ainda estamos muito distantes de entender com clareza a interdependência de cada um dos lados, ou seja, como relacionar os fatores que compõem um bom ecossistema, com atores envolvidos e fluxo de valor gerado. Para isso, tenho pesquisado muito sobre aprendizagem organizacional em ecossistemas de inovação aberta e em breve trarei mais novidades. Espero que tenham curtido o post.
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REFERÊNCIAS
- Howkins, J. The creative economy – How people make money from ideias. London: Penguin Books, 2001.
- Howkins, J., Creative Ecologies: Where Thinking is a Proper Job (2006).
- Hautamäki, A. (2014). Creative economy and culture at the heart of innovation policy.
- Harrison, J. D. (2012). “Small Businesses Created “Essentially Zero” Jobs in August,” Washington Post. September 6, 2012 and updated September 7, 2012. http://www.washingtonpost.com/business/onsmall-business/small-businesses-createdessentially-zero-jobs-in-august/2012/09/06/91da9a88-f84e-11e1-8253-3f495ae70650_story.html. Accessed on December 14, 2012.
- Schumpeter J. Business cycles: a theoretical, historical and statistical analysis of the capitalist process. [Livro]. – Nova York : McGraw-Hill, 1939. – Vol. 1.
- Granstrand, O, Holgersson, M. 2020. “Innovation ecosystems: A conceptual review and a new definition,” Technovation, Elsevier, vol. 90.
- OCDE (2006). Manual de Oslo: diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação tecnológica [Relatório]. – São Paulo : FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos).
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