QUAL DEVE SER O COMPORTAMENTO DO EMPREENDEDOR NAS DIFERENTES ETAPAS DE UMA STARTUP?
Desde o início dos anos 2000 que observamos o surgimento de diversas abordagens e metodologias para ajudar com a tarefa de desenvolvimento e gestão de startups, muito pelo entendimento sobre o valor gerado por tais empreendimentos alavancados pelo sucesso de muitos negócios surgidos no ecossistema do vale do silício. Uma metodologia muito bem apresentada e observada para a realização dessa tarefa é o “Customer Development” de Steve Blank (2012). Em seu livro “The Four Steps to the Epiphany”, Steve traz 4 importantes estágios que precisam ser vivenciados por toda startup para que consigam o sucesso no mundo dos negócios, especialmente considerando o contexto com o qual uma startup está inserida.
Texto original em: medium.com
4 passos do Customer Development
Fonte: adaptado de (Blank, 2012)
Entretanto, o processo proposto sugere um empiricismo muito similar a um processo de experimentação laboratorial com base em testes e protótipos. Porém, tal processo deve (pelo menos é o que EU penso) ser também considerado também um processo de design tradicional, onde precisamos divergir para depois convergir. O famoso duplo diamante do processo do Design Thinking pode e deve ser considerado como um grande aliado em diversos momentos desse processo, e vou dizer o porquê:
Framework do Diamante Duplo do Design Thinking
Fonte: Grand Designs Inovação
Se fizermos uma interseção entre os dois conceitos, podemos dizer que a etapa de “Descoberta do cliente” (fig.1) do Customer Development seria um momento tanto divergente quanto convergente (demonstrado com marcação “1 e 2” na fig.2), onde precisamos adquirir mais conhecimento – em seus diferentes estados – para entendermos melhor quem é o nosso cliente inicial (beachead) e seus principais problemas. Tal atividade pode ser considerada um processo de design pois a gestão desses dados e informações deve ser feita, preferencialmente, com auxílio de ferramentas e métodos do design e ciências sociais. Exatamente por isso, é importante entendermos qual deve ser o comportamento do empreendedor em cada momento do processo de desenho, desenvolvimento e gestão de uma startup.
A fig.3 evidencia que esse processo trafega entre dois mundos: Concreto e Abstrato. A maioria dos conceitos sobre startups – como o Customer Development e Lean Startup (Ries, 2012)- consideram majoritariamente o mundo concreto. Nesse mundo, o empiricismo impera como a principal forma de descoberta e validação das necessidades do negócio. Isso acontece muito pelo fato de nesse momento estarmos situados em fases mais convergentes do processo. Por isso, somos mais capazes de formular hipóteses (nulas e alternativas) para posterior validação empírica, exatamente como um processo de pesquisa ou laboratório. Entretanto, as fases iniciais da criação e desenho de um negócio inovador não parecem dar muito espaço para esse pensamento, tornando-o ineficiente.
Fases do processo de Desenho de Serviços Inovadores
Fonte: Grand Designs Inovação
Portanto, o processo de “descoberta do cliente” deve ser feito por algo menos “aristotélico”, onde possamos levantar perguntas mais abertas (e não necessariamente hipóteses afirmativas), como a existência de um cliente (e a própria “existência desse cliente” já pode ser considerada uma pergunta/hipótese) que possui “Jobs To Be Done”, que também devem ser considerados como tal. Então, todo o processo de entendimento do problema, bem como descoberta do cliente e busca por solução são muito mais abstratos do que parecem. Dessa forma, deve-se usar o máximo possível de técnicas e ferramentas de design para organização das informações, principalmente por meio de uso do espaço visual para criação de significado.
Falando nisso, perceberam que estamos falando “a mesma língua” de uma das ferramentas mais importantes do processo de descoberta do cliente? Sim, o Canvas de Proposta de Valor. É ele que devemos usar como repositório de informações nesse processo divergente-convergente de levantamento e validação de hipóteses de valor, ou seja, aquelas que nos indicam quem são nossos clientes e o que devemos resolver para ele.
Repare que ainda não estamos falando de solução, mas sim de um processo de descoberta do que essa solução deve resolver e para quem. Portanto, estamos falando do lado direito do Canvas de Proposta de Valor, conforme demonstrado em fig.4 abaixo:
Canvas de Proposta de Valor
Fonte: adaptado de (Osterwalder, 2015)
Para efeitos de localização geral, ainda estamos nas fases de descoberta do cliente do modelo de monetização Customer Development e, por que esse processo é tão importante que devemos fazê-lo diversas vezes? Porque precisamos buscar o encaixe do problema com a solução (com auxílio do VP Canvas), assim como o encaixe da solução com o mercado, podendo ser explicado por: lado esquerdo do VP canvas, BMG Canvas (especialmente modelo de receita, recursos e atividades-chave), bem como ferramentas de análises de mercado endereçável. Portanto, o objetivo inicial dessa fase é a descoberta do beachead, aquele público que possui necessidades tão latentes que poderá nos ajudar a descobrir não só como resolvê-las melhor, como também trocar tais benefícios por quantias, iniciando-se, portanto, o desenho do modelo de monetização.
Curva de adoção de produtos inovadores
Fonte: adaptado de (Moore, 1991)
Como mostrado na fig.5, esses clientes (beacheads) são determinantes para tornar o conceito capaz de vencer o “abismo da morte” entre adotantes iniciais (“Early Adopters”) e Pragmáticos da solução, tornando o conceito com maior potencial de retorno sobre investimento (ROI) por possuir mercados ainda mais abrangentes e/ou siginificativos.
Maravilha! Tudo estando certo, então podemos dizer que possuímos um ótimo entendimento de quem é nosso cliente, o que resolvemos para ele, assim como informações sobre o mercado que ele encabeça. Entramos, portanto, num processo divergente-convergente novamente, ou seja, precisamos descobrir apenas como trocar com esse cliente o “Valor” (ou benefício) entregue por nossa solução por um “Valor Monetário”. Por isso, chegamos em uma fase importante da modelagem de negócio (que explicarei com mais calma num próximo post).
Nesse momento vale lembrar o conselho dado pelo próprio Eric em seu livro que: “nunca devemos confiar na resposta de um cliente sobre o valor pago por ele por uma solução sem que ele realmente coloque suas mãos no bolso”. Portanto, devemos entender que esse processo, por mais empírico que seja, deve ser feito por meio de um “teste de mercado”, ou seja, uma solução (ou MVP) deve ser criada e colocada “à venda”. A fig.6 mostra a ferramenta de “Premise Guide”, onde podemos listar as principais premissas ou hipóteses da nossa solução, inferir a importância de cada uma delas, bem como determinar o modelo de testes (dados, protótipo, mercado).
Modelo de “Premise Design”
Fonte: adaptado por Grand Designs Inovação de (Liedtka, 2011)
Afinal, é necessário lembrar que, por mais que sejamos uma startup com liberdade de criação, precisamos usar bem nossos recursos, principalmente o tempo. Portanto, a gestão de testes e hipóteses seja talvez o principal elemento de gestão de uma startup. “Time is Money”. Em um próximo post vou explicar um pouco melhor o processo de teste e como utilizar o Guia de Premissas e outras ferramentas muito importantes nesse momento.
Resumindo, podemos dizer que nas duas primeiras fases do Customer Development o empreendedor deve ser um misto entre “designer e engenheiro”, entretanto, nas fases de crescimento e exploração do negócio deve-se adicionar ótimas características de estratégia, visão e gestão de negócios. Em breve trarei mais dicas sobre esses momentos finais.
Espero poder ter esclarecido algumas dúvidas usuais de maneira que consiga “sair do óbvio” e gostaria que comentassem a respeito de quais desses tópicos e ferramentas acima gostariam que eu falasse mais a respeito. Caso se interessem, podem dar uma olhada no “TIB” (Thinking Inside the Box), uma solução que criamos para ajudar empreendedores em qualquer momento que ele esteja com o seu negócio. Quem sabe não te ajuda também? 😉
REFERÊNCIAS
- Blank S. G. Do sonho à realização em 4 passos: estratégias para a criação de empresas de sucesso. – São Paulo : Steve Gary Blank, 2012. – 3 : Vol. 1.
- Brown T. Changed by Design: How Design Thinking tranforms Organizations and Inspires Innovation. – San Francisco: Editora HarperCollins, 2009. – Vol. 1.
- Liedtka J. Design for Growth: A Design Thinking Tool for managers. – New York : Columbia Unity Press, 2011. – Vol. 1.
- Osterwalder A. [et al.] Value Proposition Design: How to Create Products and Services Customers Want. – [s.l.] : Hoboken Wiley, 2015.
- Osterwalder A. e Pigneur Y. Business Model Generation. – New Jersey : John Wiley & sons, 2010.
- Ries, Eric. The Lean Startup: how today’s entrepreneurs use continuous innovation to create radically successful businesses. New York: Crown Business, 2011.
- Ulwick A. Jobs to be done: theory to practice. – [s.l.] : Idea Bite Press, 2016. – 1 : Vol. 1.
- Moore, G. A. (1991). Crossing the Chasm: Marketing and Selling High-Tech Goods to Mainstream Customers. New York: Harper Business.
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